domingo, 12 de outubro de 2008

Epílogo

Após uma longa tarde de sono, Carlos Santa Cecília pegou seu carro e dirigiu até Copacabana. Estacionou no Leme, tomou uma cerveja em um quiosque da praia e foi ao edifício que freqüentava pelo menos uma vez por semana. Cumprimentou o porteiro que já o conhecia, subiu no elevador de porta pantográfica e caminhou até o apartamento 205. À porta, conferiu o relógio. Ainda faltavam cinco minutos para uma da manhã.

Santa Cecília ficou sentado no chão do corredor até que a porta do 205 se abriu. De dentro saiu uma bela jovem, de olhos castanhos brilhantes e cabelos no meio das costas. Era Sabrina Morena, uma das “namoradas” de Santa Cecília. Ela o puxou para dentro e o jogou na cama. Sabrina era uma stripper virtual. Tinha seu próprio site, onde fazia ao vivo sua apresentação diariamente à meia-noite.

Carlos e ela se conheceram em um bar. Um não sabia o que o outro fazia. Quando descobriram, se afastaram. Ele achava que ela era prostituta. Ela temia as intenções de um jornalista. Acabaram cedendo a um relacionamento aberto.

Ainda na cama, enquanto o sol nascia, Sabrina agarrava-se a Santa Cecília. Parecia ter se lembrado de algo e estava um pouco trêmula.
- O que houve?, perguntou Carlos, abraçando-a.
- Uma amiga… Eu estou com medo, Carlos.
- Me diga o que foi…
- Uma amiga minha desapareceu — esclareceu Sabrina. — Ficou de me ligar, mas nunca ligou. E o site dela já está for a do ar há alguns dias.
- Ela era prostituta?, questionou o jornalista.
- Não, Carlos. Era como eu. Tinha o site, mas não tinha contato com os clientes.

Santa Cecília beijou a testa da jovem, que não tinha mais que vinte e cinco anos. Levantou da cama, procurou sua calça e apanhou o celular.
- Lincoln?
- Você sabe que horas são, Carlinhos?, reclamou o diretor de redação.
- A hora certa. Escuta… Lembra que eu te falei que queria voltar a fazer reportagens? Pois acho que tenho minha primeira pauta.

Cap 65 - Próxima edição

Lincoln Albuquerque estava recostado na cadeira de sua sala, com Bia Lacerda aplicando uma bolsa de gelo em sua cabeça. Sempre ignorando as proibições, ele fumava no ambiente fechado. Chico Antônio lia a edição especial com tiragem limitadíssima que correu em algumas delegacias durante a madrugada para convencer alguns policiais a acompanharem a equipe de reportagem até o apartamento do deputado. “Poderiam ter escolhido outra foto para a capa”, lamentava Chico, mesmo sabendo que a edição for a fechada às pressas.

Carlos Santa Cecília estava ao telefone. Avisava à ex-mulher e à filha que já era seguro retornar ao Brasil, mas que a decisão cabia unicamente a elas. Com um lenço, o colunista limpava o sangue que ainda escorria do nariz e lhe sujava o bigode.

Todos na sala pensavam nos perigos que assumiram na cobertura do retorno de Armando Paglia ao Brasil. Alguns, como Carlos e Lincoln, sabiam exatamente os riscos que corriam. Outros, como Bia e os estagiários, nem faziam idéia do quanto a quadrilha de Dom Armando poderia ser perigosa.

No fim das contas, Paglia não foi preso pelas ameaças a Santa Cecília e seus colegas, mas apenas pela morte do deputado. Apesar de uma série de relatos repletos de testemunhas, a polícia preferiu acreditar que os jornalistas apenas acrescentaram ação à narrativa para valorizar seus trabalhos.

Os possíveis prêmios que encheram os olhos de alguns no início da cobertura nunca vieram. Pelo contrário; todos no Primeira Página foram muito criticados pelos riscos a sujeitaram a si mesmos e aos colegas. Mas outros jornalistas reconhecem a qualidade da cobertura de Carlos e dos outros.

Ainda naquele mesmo dia, cinco parlamentares subiram ao plenário para render homenagens ao deputado. Na frente da televisão, sempre atento, Santa Cecília anotou o nome de cada um deles. Ninguém elogia um corrupto se não estiver envolvido em esquema semelhante. “São meus próximos alvos”, pensou Carlos.

Quase na hora do almoço, Cosme Fagundes voltou ao jornal ao lado de Catarina Casaverde. O e-mail encontrado pela editora na casa do deputado, somado ao depoimento da mãe de Leninha de que ela teria um caso com o parlamentar, ajudou a inocentar Fagundes. Além disso, informações passadas pelo garçom Genaro e por freqüentadores do restaurante próximo ao Primeira Página preencheram as lacunas restantes.

Assim que o relógio apitou meio dia, todos pegaram suas coisas e se levantaram.
- Aonde vocês pensam que vão?, indagou Lincoln.
- Almoçar — respondeu Bia.
- E dormir — acrescentou Carlos.
- Dormir? — assustou-se o diretor de redação. — Vocês só podem estar brincando. Quero todo mundo de volta até uma da tarde. Nós temos a edição de amanhã para fechar.

Santa Cecília não conteve o riso diante do desespero de Lincoln.
- Não posso falar por eles, meu amigo, mas falo por mim. Boa noite, Lincoln!
- Carlinhos…? Carlinhos, volte aqui!