quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Cap 24 - Complexo do Alemão

Enquanto se aproximava do Complexo do Alemão, Bia Lacerda pensava que já deveria estar acostumada a entrar em favelas. Quem cobre Cidade inevitavelmente acaba seguindo a polícia em operações contra traficantes. E quem, como ela, quer se tornar uma referência no jornalismo, precisa aprender a correr riscos e entrar sozinho na toca das serpentes.

A repórter combinara com Fátima Macedo, uma antiga colega de faculdade que trabalhava em uma organização não governamental na favela. Era filha de um milionário, estudara na Europa na infância e abandonou tudo para tentar entender melhor as necessidades dos acuados pelo sistema. Fátima a levaria até um bar onde Renatinho Gordo jogava sinuca.

O estabelecimento era especialmente assustador. Num muro, marcas de balas denunciavam que inimigos do comando eram executados sem muita cerimônia. Um garoto sentado em um canto dava peteleco em bolinhas de gude. Na outra mão, um tresoitão.

-Renatinho tomava cerveja encostado no balcão. Fátima foi até ele e o chamou para ir à sede da ONG. Lá, Bia se apresentou.
- Então uma repórter teve a audácia de entrar na nossa área — desafiou o Gordo.
- Não é bem isso, Renatinho. Não tenho intenção de prejudicar ninguém. Só gostaria que você confirmasse uma informação para mim.
- Uma informação? E o que eu ganho com isso?, perguntou Renatinho, passando a mão na cintura da repórter.
- Eu sei que esta não é a sua preferência… Que você gosta de carnes mais macias… Se você me ajudar eu não conto para ninguém que você está aqui.
- Você acha que me ameaça? Eles sabem que eu estou aqui. Ninguém mexe comigo porque não é macho o suficiente! O que você quer saber afinal?
- Se foi Armando Paglia quem te contratou para seqüestrar Ana Santa Cecília.
- Você está me acusando de alguma coisa?
- Por favor, Gordo, não se faça de vítima. Você matou Cícero Andrade porque ele ajudou a Ana a sair do morro. Obviamente estava envolvido no seqüestro.
- Eu nem sei de quem você está falando…
- Da mulher do jornalista! A que estava grávida!

Renatinho Gordo andou de um lado para o outro coçando a cabeça.
- Eu tenho uma notícia boa e uma notícia má. A boa é que eu me lembro dessa história. A má é que eu não vou te contar nada, porque eu não ganho nada com isso — e saiu rindo.

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